quinta-feira, 20 de janeiro de 2011

"O mais verde é sempre além do que se pode ter"

Nós criamos muitas expectativas pelo desconhecido. Por não possuir algo, idealizamo-la e quando a temos nas mãos nos frustramos por não ser o que nós queríamos e para disfarçar essa frustração, acabamos por idealizar outra coisa e nunca paramos de nos frustrar.  
Se tomarmos um caminho A, nos arrependemos depois por não ter tomado o caminho B. Não é que o caminho A não seja bom, é que nós queremos todos os caminhos. A possibilidade parece melhor do que a realidade. Pois na possibilidade não existem defeitos, nós não imaginamos defeitos. Os defeitos parecem existir somente onde estamos agora. O que nós não temos ou estamos sempre parece ser melhor.
De perto os defeitos são gigantes. De longe eles são inexistentes. Por isso nós escutamos tantos relatos de pessoas que se apaixonam por amigos virtuais. Normalmente sabemos muito pouco das pessoas que conhecemos só pela internet e para suprir essa necessidade de saber mais, completamos essas lacunas com qualidades que nós admiramos.
Criamos pessoas ideais para conviver conosco, mas como vi certa vez em um filme, o ideal é o que só existe na ideia. Buscamos o corpo perfeito, o namorado perfeito, a amiga perfeita, o trabalho perfeito e por ai vai. Às vezes essa vontade de ter a perfeição nos ajuda para tentar nos aperfeiçoar, nos lembra que podemos sempre ser melhor se dermos um pouco mais de nós. Mas vejo por muitos corredores pessoas exaustas e enfraquecidas por não conseguir chegar a perfeição.
O que não sabemos ou o que sabemos e apenas não queremos lembrar é que tanto o ideal como a perfeição não existem, ninguém é perfeito e nem nunca vai ser.
Queremos a perfeição, o inexistente. Queremos o que não temos e não podemos ter. Temos uma fome que só com comida não se mata.

sábado, 15 de janeiro de 2011

A história de Laura

  Faz uns dois anos que estou com o mesmo celular e só a alguns meses atrás descobri que ele tem, sim, aquele lugarzinho para colocar pingentinhos de celular. Sempre achei que não tinha e era meio frustrada por isso, afinal minha mãe faz os pingentes de biscuit para celular mais lindos do mundo. Todas as minhas amigas carregavam obras da minha mãe penduradas em seus celulares e eu não.
  Mas então eu descobri a verdade: meu celular não é desprovido de tal local para colocar os berimbelos! Tratei logo de consultar minha mãe para saber se ela poderia fazer um especialmente para mim, mas antes que eu pudesse perguntar alguma coisa, apaixonei-me por uma galinhazinha linda que estava sentada em sua mesa, amarelinha com o bico bem laranja e olhos pidões. Foi amor a primeira vista, juro. Fiquei com ela. Minha mãe nomeou-a de Laura.
  Ela nos encantou. Eu que sempre falei sozinha, agora falava com a Laura, discutia  e algumas vezes até levava broncas dela que me olhava com os mesmos olhos pidões.
  Laura entrou para a família e todas as minhas amigas já a conheciam e algumas insultavam com ela, alegando que era um pato e não uma galinha. E posso afirmar que essas brincadeiras confundiram bastante a inocente cabecinha de Laura.
   Ela não era uma galinha quieta não, muito pelo contrário. Até quebrou a pata algumas vezes. Não sei como nem aonde isso aconteceu pois ela se recusava a me contar. Mas ela ficou bem, já que minha mãe se mostrou uma ótima cirurgiã de galinhas de biscuit e implantou uma nova pata para que Laurinha pudesse ao menos ficar de pé.
   Aconteceu uma festa de família e eu nem pensei duas vezes antes de levá-la comigo. Até certo ponto foi extremamente feliz, pois não conheço metade da família e a prima que normalmente ficava comigo estava agora com o namorado e Laura não me deixou sozinha, ficou junto a mim.
   Então eu tive a triste ideia de andar com o celular na mão, achava bem divertido ver a Laura brincando de big jump no meu celular. O resultado disso foi que no dia seguinte, Laura tinha desaparecido. Seu corpo não foi encontrado, mas mesmo assim acreditamos que o pior tenha acontecido, pois choveu durante a madrugada e Laura era feita de biscuit e... provavelmente derreteu.
   Fiz uma simulação do acidente – suponho que tenha sido um acidente pois Laura não tinha inimigos – e tudo indica que a culpa foi do celular, que não a segurava devidamente.
Até hoje estou de luto por Laura. Trocarei de celular em seu respeito.